Somos singulares, indivíduos forjados na caldeira de nossa família, de nosso lugar, de nossa cultura, de nossas experiências e de tudo aquilo que de tão nosso não sabemos de onde vem. O nosso “eu” se reverbera no nosso trabalho, nas nossas relações, nos nossos corpos. Aquilo que carregamos em nós é material sensível dos mais potentes e podemos manejá-lo tanto na busca por uma técnica pessoal de trabalho quanto na utilização e ressignificação de conteúdos reais de nossas vidas que sirvam à escrita de cenas autorais que nos atravessam e atravessam a quem nos assiste.
Em um trabalho artístico, uma linguagem que caminha pela expressão e representação de nós no mundo e do mundo em nós, as subjetividades se entrelaçam ainda mais com o nosso ofício, e o real e o fictício não cessam de se atualizar.
A capacidade que a ficção tem de ordenar os eventos em uma trama significativa faz dela uma formidável alavanca para produção de sentidos.
Conseguimos nos distanciar um pouco do que somos, vivemos e lembramos para nos entender melhor. Construímos um novo mundo possível e nos transportamos para ele.
A vontade que eu sinto de me colocar na cena, e que senti nas outras atrizes que me motivaram na escrita do projeto DE SOLOS FEMININOS, parecem ser embasadas na ideia de reescrita de nós mesmas como um ato político de resistência e emancipação feminina.
Estar em cena com um projeto pessoal, com nossos escritos, com partes de nossa história, de nossas aflições e aspirações, traz muita satisfação e nos empodera enquanto mulheres e enquanto artistas.
Na minha concepção como mulher artista dentro de um processo acompanhado por uma provocadora cênica, trata-se de poder fazer as minhas próprias escolhas mesmo estando amparada por outras opiniões. E penso que dentro de um coletivo de mulheres, que de diferentes formas carregam a herança da cultura patriarcal que nos silencia e trabalha para retirar nossa confiança, há uma potência ainda maior de se trabalhar com este tipo de dinâmica.
Finalizo com a atriz e pesquisadora Ana Cristina Colla e na sua identificação do Desejo como um importante elemento de criação e de motivação a se levantar e continuar a criar. E eu desejei muito construir um coletivo em que houvesse sim desejo, mulheres desejando estar juntas, desejando estar em cena e desejando se encontrar periodicamente para além do compromisso assinados. Seguimos DESEJANDO.
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